quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Quixotesco e maquiavélico

Fiz este pequeno texto, “Quixotesco e maquiavélico” a Guisa de Apresentação do vigésimo número da Revista Conceitos, cujo conteúdo completo em PDF pode ser acessado no link http://www.adufpb.org.br/site/wp-content/uploads/2014/09/REVISTA-CONCEITOS-20-2.pdf: Quixotesco e maquiavélico Jaldes Meneses “Pois se observa no Evangelho que curando Cristo de todos os gêneros de enfermidades e ressuscitando todos os mortos, a nenhum doido sarou”. Padre Antônio Vieira. Aconteceu com as obras mais conhecidas de Nicolau Maquiavel e Miguel de Cervantes – “O príncipe” e “Dom Quixote” –, os criadores da teoria política e do romance modernos na distância dos dois fabulosos séculos de nascimento da modernidade ocidental, respectivamente 1513 e 1605 –, o fenômeno de se tornarem tão populares que viraram adjetivos. Maquiavélico tornou-se sinônimo de pessoa astuta e diabólica na luta pela conquista do poder, na qual não interessam quais os meios de alcançar determinado fim, enquanto quixotesco virou símbolo de louco sonhador de objetivos utópicos e inalcançáveis. Parecem antônimos: o príncipe maquiavelino é autossuficiente, frio e realista, por outro lado o cavaleiro de Cervantes é dependente de devaneios e miragens inexistentes na realidade, feito o amor impossível de Dulcinea del Toboso. Michelet, historiador romântico francês, dizia a respeito de Joana D´Arc que o surpreendente na “donzela”, que logo se tornou heroína nacional francesa, não era a loucura, mas o núcleo de lucidez que se escondia no devaneio. Um homem do renascimento como Maquiavel convivia com a loucura no mesmo espaço, inclusive a elogiava preciso fosse – lembremo-nos de, a propósito, do famoso elogio de Erasmo de Rotterdam, escrito na mesma época. Qual loucura maior que não medir esforços para atingir determinado fim? No realismo de meios e fins do príncipe se encontra acantonado a loucura, as lutas dinásticas européias tão bem descritas por Shakespeare (Hamlet, Ricardo III, Macbeth) nada mais são que a dramaturgia da teoria política maquiavélica. A assepsia entre razão e desrazão era desconhecida no mundo de Maquiavel. O ponto cirúrgico aconteceu exatamente no século seguinte, e o “Dom Quixote” – a saga do cavaleiro andante deslocado do mundo – significa exatamente um desses pontos de ruptura. Não é à toa que vinte e dois anos depois de “Dom Quixote” (1637), Descartes brindava-nos com “O discurso do método”, sancionando em definitivo, através do método científico racional-moderno, a separação entre razão e desrazão, a mesma falsa assepsia da razão do trabalho de sangue e poder do Príncipe que formou esta entidade conhecida por Estado Nacional (“o mais frio e cruel dos monstros”, nas palavras de Nietzsche, o mesmo Estado que as utopias de Marx, um dia, pensou em fazê-lo desaparecer).

quarta-feira, 31 de março de 2010

Era Lula (I): política internacional

Jaldes Reis de Meneses

É conhecida a imagem do Brasil como um país ciclotímico, que alterna comportamentos de euforia e depressão, de alto-astral e mal-estar. Esta característica do país contaminou até mesmo os clássicos do pensamento ensaístico sobre a nossa formação histórica, que pode ser dividido, entre dois exemplos, o dionisíaco Gilberto Freyre e as prédicas de uma nova civilização nos trópicos ao soturno Raimundo Faoro e a eterna viagem redonda ao ponto morto de começo do Brasil, a eterna dominação do Estado por uma espécie de patronato político que nunca cedeu milímetro de poder aos de baixo, senão como cooptação seletiva.
Sem dúvida, nos últimos anos (a que chamamos de “era Lula”) vivemos um daqueles momentos de euforia, tanto que mesmo a crise econômica internacional e o decréscimo de 0,2 do PIB ano passado – em outras conjunturas combustível de uma grave crise política –, estão longe de estancar o nosso otimismo com o futuro. Resta indagar se vivemos um daqueles momentos de euforia que logo se esfumam, ou se há bases estruturais de sustentar a hipótese de que o Brasil enfim atravessou as cadeias da periferia do mundo capitalista. Nesta série de pequenos artigos, buscaremos fornecer subsídios à reposta da hipótese (observando que é impossível obter uma resposta conclusiva), ao mesmo tempo em que elucidamos elementos da história brasileira recente.
Um fato é certo: até nos anos noventa, compúnhamos um bloco estrutural comum com dois outros países da América Latina – o México e a Argentina –, contudo nos dias de hoje o volume bruto de nossa economia exportadora de grãos, auxiliado pelo crescimento do mercado interno, nos vem permitindo subir alguns degraus, criando uma situação nova, na qual o capitalismo brasileiro se instala num patamar junto com a China, a Índia e a Rússia.
A economia e a política se imbricam. Tal circunstância tem motivado a possibilidade de tentar formular uma política internacional cujo eixo não é mais precisamente o alinhamento automático aos Estados Unidos (Colômbia), mas de negociar posições geopolíticas, principalmente no hemisfério sul. A presença de tropas brasileiras no Haiti é o emblema mais evidente da estratégica de negociar posições. As inusitadas aproximações com a França de Sarkozy são um segundo índice revelador das intenções brasileiras, entre vários merecedores de citação, em especial a polêmica tomada de partido pelo Irã de Ahmadinejad e dos aiatolás, na queda de braço com a ONU sobre o caráter de seu programa nuclear.
Demais disso, se pensarmos a outra política internacional existente na América Latina, o bolivarianismo revolucionário de Hugo Chávez, como de confronto com os americanos, na medida em que ela é objeto de contestação aberta por forças internas na Venezuela, embora se consolidando o processo revolucionário num país economicamente atrasado como a Bolívia, na prática a estratégia chavista encontra-se na defensiva, na verdade mais servindo como reserva indireta dos objetivos da política internacional brasileira, pois o confronto à esquerda compõe a relação de forças de quem negocia ao centro.
Do ponto de vista das eleições presidenciais de 2010, o eleitor deve saber que pela primeira vez em tempos recentes haverá duas políticas internacionais claramente em confronto, a do alinhamento automático com os Estados Unidos, representado pelos tucanos (a atuação dos tucanos, principalmente na Comissão de Relacionais Exteriores do Senado deixa explícito a inflexão tucana, inclusive em relação ao governo de Fernando Henrique Cardoso) e a de negociar posições estratégicas, vinculada ao bloco político que gravita em torno do lulismo. Quanto ao bolivarianismo, ele é institucionalmente subrepresentado no Brasil, em que pese à presença ativa no MST e em alguns movimentos sociais.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Bela Cigana

Jaldes Reis de Meneses
Um dia, numa avenina paulista, em noite de garoa,
Lorena desafiou o chefe a provar a verdade,
E, no mesmo instante, ato contínuo, a matá-la.
Saiu da reunião. Enfrentou a garoa. E gauche na vida.
Manhã cedo passa: a orfandade das coisas simples:
A bússola apontou em direção ao primeiro namorado
em Volta Redonda. Lorena, menina paulista, apanhou
O trem em Mogi das Cruzes. Foi dar de cara numa greve.
Andou, caminhou, apanhou, aprendeu, desconfiou.
Recolhe a voz, finge-se surda a qualquer alarido.
Sabe que as verdades dos jornais amanhecem velhas,
Passaram, um dia, numa avenida paulista, em dia de garoa.

sábado, 1 de agosto de 2009

René Char

Nossa herança não vem de nenhum testamento.

René Char

Todos os herdeiros devem se considerar bastardos, portanto, libertos.

sábado, 27 de junho de 2009

Michael Jackson

A dança das pernas mais os gestos da mãos:

Nunca lhe interessou ser preto nem branco
Mas um corpo ereto de homem solto no ar.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Chico de Oliveira no CCHLA

Professor Emérito da Universidade de São Paulo (USP) e um dos mais importantes intelectuais brasileiros vivos, Vice-Presidente da SUDENE nos tempos heróicos de Celso Furtado, autor de uma obra teórica fundamental para compreensão do Brasil contemporâneo, com títulos clássicos e uma vasta produção bibliográfica no qual se destacam, entre outros títulos, livros como “Crítica da Razão Dualista/O Ornitorrinco” e “Elegia para uma (Re)Religião/Noiva da Revolução”, o Professor Francisco de Oliveira estará no AUDITÓRIO 411, sexta-feira (29/05), às 09h00min horas, para pronunciar a palestra MARX E A CONDIÇÃO HUMANA. A promoção é conjunta entre o CCHLA e o SECTS (Setor de Estudos em Cidadania e Teoria Social do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social).
No começo de maio, o filósofo Antonio Cicero esteve no CCHLA discorrendo sobre o CONCEITO DE NATUREZA HUMANA. Com Chico de Oliveira, o tema das mutações do humano continua a ordem do dia, pois na palestra, o professor deverá propor lançar os que se referenciam no âmbito do projeto da emancipação humana, de Marx e de todos os socialistas, a uma reflexão urgente: em meio da crise da sociabilidade na qual o controle do trabalho sobre o que produz é uma quimera, e mesmo o trabalho intelectual, imaterial, típico da revolução técnico-científica, vem reproduzindo o antigo ethos e alienação e estranhamento, como fazer valer a proposta do socialismo e do comunismo?


PALESTRA
MARX E A CONDIÇÃO HUMANA

Expositor: Francisco de Oliveira (Professor Emérito da Universidade de São Paulo)
Data: Sexta-feira (29/05)
Horário: 9:00 horas

Local: Auditório do CCHLA

Promoção:

- CCHLA
- Setor de Estudos em Cidadania e Teoria Social (PPGSS)

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

João Cabral, em nenhum poema

Jaldes Reis de Meneses

Preferir o anjo a pantera
Condensar o preciso em vago:
Nesse livro que se inconfessou:
Ainda se disse, mas com virtude.
Noutro, dizendo-se de cabeceira,
Disse-se anverso, porém sujo:
Capaz de coçar e não gozar,
Disse-se, mas com onanismo.